O Fórum Econômico Mundial de Davos 2020 traz, no seu manifesto, um propósito universal para as empresas na quarta revolução industrial e o centro do tema é o engajamento de todos os stakeholders para a criação de valor sustentável e compartilhado.
Por isso, resolvi reescrever este post, que é de outubro de 2019, e se chamava "O que mata as empresas".
O valor da ação tem sido, ao longo dos últimos tempos, o centro da discussão do papel do C-level.
No entanto, o valor da ação é apenas um dos indicadores do desempenho de uma empresa e de sua gestão. O valor da ação interessa diretamente a apenas um dos stakeholders - o acionista.
O compartilhamento de valor com outros stakeholders, além do acionista, é visto por muitos como redutor do lucro e estaria fora do escopo dos gestores.
A The Economist de 22 de agosto de 2019 trouxe na capa a pergunta "What companies are for?" e discutiu o tema em dois artigos. Fica da leitura a impressão de que propósito e responsabilidade social são incompatíveis com lucro e valor da ação. Este post nasceu da leitura dessa revista.
Na versão anterior do post, algumas pessoas comentaram a dureza da minha afirmação que vem a seguir, mas ela faz sentido.
O que mata as empresas é a combinação perversa de um conselho de administração focado no valor da ação e um C-level covarde.
Meu primeiro ponto é: valor da ação é consequência da gestão estratégica, é resultado da boa gestão. Nenhum executivo age diretamente sobre o valor da ação.
O conselho que só olha para o valor da ação e não discute com o C-level a estratégia, ou seja, como vamos trabalhar para aumentar o valor da ação, erra de forma primária. Submetido a um conselho pobre na orientação estratégica, o C-level pode se acovardar e trabalhar superficialmente buscando resultados financeiros imediatistas, bônus maximizados e rápida saída da empresa. Ou, ao contrário, agindo de forma responsável, pode propor os caminhos sustentáveis para a perenidade da companhia.
Meu segundo ponto é: o valor da ação está associado a lucro, perenidade, reputação e ética.
Lucro vem do valor percebido pelos clientes e a justa paga que a empresa recebe por isso, associado ao trato com fornecedores, processos, colaboradores, tecnologia (royalties).
Perenidade é resultado da competência para evoluir, reconhecer tendências, mitigar riscos, evitar custos ocultos.
Reputação é a soma das percepções de todos os stakeholders e da sociedade, incluindo como a empresa lida com o meio ambiente e resíduos.
Ética é a capacidade de estabelecer relações adequadas e exemplares, muito além do que a lei determina, no presente contínuo.
Esses deveriam ser os temas de uma reunião de conselho.
Meu terceiro ponto é: uma empresa tem sempre responsabilidade social inerente ao seu negócio.
O produto ou serviço que a empresa oferece precisa ser útil, precisa ter valor para quem compra e essa é a primeira responsabilidade social da empresa. Como a empresa vai contratar, reconhecer e remunerar seus colaboradores também é uma responsabilidade social. Mais uma escolha com caráter social envolve os fornecedores. Como a empresa vai lidar com os recursos naturais que utiliza e qual destino dará aos resíduos que produz e aos resíduos resultantes do consumo daquilo que entrega aos clientes. Todas essas são responsabilidades sociais básicas. essenciais, que já nascem com o empreendimento.
A conclusão é que sim, as empresas tem responsabilidade social e não há oposição entre atender acionistas e demais stakeholders. É o equilíbrio dessa complicada equação que determina, ao fim de tudo, o valor da ação. Quero entender que o manifesto de Davos 2020 esteja reforçando isso.
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